Programa Jovem Aprendiz aproxima pessoas com deficiência do mercado de trabalho

Obstáculos que já são grandes normalmente, aumentam nos casos de PCD

Construir um bom currículo, ter uma boa oratória e provar as próprias habilidades em um portfólio é algo complexo até para profissionais de carreira, mas para quem ainda não tem experiência é muito mais difícil. Imagine tudo isso somado ao fato de a sociedade ver sua presença como um empecilho para a empresa. É isso que os adolescentes com deficiência passam para conseguir entrar no mercado de trabalho.

Segundo dados da Pesquisa Nacional de Saúde, de 2019, realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), apenas um em cada quatro pessoas com deficiência tem um emprego. Ainda segundo a pesquisa, 28,8% não desejam trabalhar e 10,5% afirmam não conseguir um trabalho.

Para reduzir esses preconceitos no mercado de trabalho, a Lei do Aprendiz (10.097/2000) determina que empresas devem ter entre 5 a 15% do quadro de colaboradores como aprendizes, incluindo jovens com deficiência física, auditiva, visual, intelectual ou múltipla, sendo ela visível ou não, sem limite de idade. A Lei nº 7.853/89 também estabelece que o Poder Público assegure às pessoas com deficiência o pleno exercício dos direitos básicos, o que inclui o trabalho.

Matheus e Gabriel conquistaram o primeiro emprego através do Programa Jovem Aprendiz. Foto: Joyce Moser/Divulgação/ Nosso TAL

Para receber adolescentes com deficiência, as empresas precisam se adequar. Inorata de Souza, assistente social do Centro de Integração Empresa Escola (CIEE), diz que, em Blumenau, as empresas precisam estar adaptadas não só na acessibilidade física, mas os demais colaboradores também devem entender as dificuldades dessas pessoas.

“Muitas empresas acabam limitando as deficiências, o que também está errado. Por exemplo, eu só quero aprendiz surdo, eu só quero aprendiz que use cadeira de rodas, quero aprendiz que tenha só uma deficiência física ou que não há a necessidade de uma muleta ou uma cadeira de rodas”, explica a assistente social.

Quando isso acontece, os consultores, assistentes sociais e psicólogos do CIEE entram em contato com a empresa para explicar os acessos necessários para os jovens poderem trabalhar.

“Precisamos dizer que o jovem é igual na questão do aprendizado, do ensinamento e na contribuição, mas que é diferente na questão dos acessos. A empresa precisa pensar inclusive se o banheiro tem ou não acessibilidade para essas pessoas”

Inorata de Souza

Apesar disso, ela esclarece que em Blumenau muitos jovens que começaram no programa Jovem Aprendiz, foram efetivados. Segundo o CIEE, atualmente sete aprendizes com deficiência trabalham em empresas da região.

A inserção de jovens surdos no mundo do trabalho

Há quase um ano no programa de aprendizagem, os gêmeos Matheus e Gabriel Bressanini, 16 anos, trabalham em uma empresa multinacional de agronegócio e alimentos em Gaspar. Matheus nasceu surdo, já Gabriel com a audição comprometida. “Eu escuto de um lado e de outro não, mas a minha vida é bem natural, às vezes eu preciso de intérprete e às vezes não”, explica o jovem.

Os gêmeos trabalham na mesma empresa, mas em setores diferentes. Foto: Joyce Moser/Divulgação/Nosso TAL

Por ser o primeiro emprego, Matheus diz que durante a entrevista ficou bem nervoso e precisou de intérprete. Depois de contratado, tudo foi melhorando. Ele ficou mais tranquilo e consegue se comunicar com as outras pessoas no ambiente de trabalho.

Gabriel explica que quando eles eram crianças, tinham dificuldade de comunicação com os pais. “Eu lembro que a algum tempo atrás eles começaram a fazer o curso de Libras, tentaram fazer o curso e mesmo assim a gente não tinha comunicação porque eu também não sabia. Aos poucos nós fomos desenvolvendo a comunicação através das Libras, que foi quando eu aprendi e eles também”, conta.

Inclusão

Miriam Peixoto, orientadora de aprendizagem do CIEE, conta que a experiência com a inclusão de jovens com deficiência tem sido importante e desafiadora.

“Tenho a preocupação de fazer com que esses jovens se sintam incluídos. Mas a maior dificuldade é dos outros jovens perceberem que os jovens com alguma deficiência também querem fazer parte da conversa e serem incluídos”

Miriam Peixoto

Na empresa, os gêmeos não têm intérprete. Apenas em reuniões ou treinamentos é que eles contam com a ajuda desse profissional. Matheus diz que às vezes tem algumas dificuldades por falta de intérprete, mas como Gabriel sabe a língua de sinais, sempre ajuda o irmão.

Por isso, no trabalho eles desenvolveram maneiras de se comunicar com os colegas, porque lá ninguém sabe Libras. Os dois vão quatro vezes por semana para a empresa e um dia para o curso no CIEE, onde eles têm um intérprete para auxiliar durante a aula.

Representação do alfabeto em libras. Arte: Palôma Cunradi/Divulgação/Nosso TAL

Segundo a educadora, nas aulas da aprendizagem as cadeiras são posicionadas em outro formato para que os irmãos consigam observar a sala e tentar uma interação maior, até mesmo com a ajuda do intérprete. Além disso, há o “Momento Libras”, que é quando a turma aprende a se comunicar através da Língua Brasileira de Sinais.

Miriam é orientadora da aprendizagem e se preocupa com a inclusão dos seus alunos. Foto: Joyce Moser/ Divulgação/Nosso TAL

Jheimy Marquezine, uma das intérpretes de Libras que trabalham para o CIEE, aponta que há uma grande carência em questão de comunicação para as pessoas surdas.

“Infelizmente, apesar de termos leis e tudo que os amparam, falta comunicação e empatia de muitas pessoas, falta o interesse das pessoas quererem aprender. Hoje em dia é tão comum aprender inglês e, por que não a língua de sinais?”

Jheimy Marquezine

Apesar dos desafios, os gêmeos se sentem inseridos no setor que trabalham. Eles dizem que embora muitos colegas não saibam Libras, fazem gestos ou tentam se comunicar de outras formas. Gabriel e Matheus contam que pretendem continuar na empresa por muito tempo e até mesmo tentar a efetivação. Os dois sonham em fazer faculdade, mas ainda não decidiram a área de estudos.

Para quem passa pelos mesmos desafios, Gabriel diz que não precisa ter medo, mas é preciso ter calma. “O que eu posso dizer é que não precisa ter medo de participar de um processo seletivo, que você pode estar se esforçando e conseguindo as suas conquistas. Vez ou outra o intérprete está ali para auxiliar. Os ouvintes também ajudam, então assim, é bem legal.”, aconselha Matheus.

Jheimy Marquezine é intérprete de Gabriel e Matheus durante as aulas da aprendizagem no CIEE. Foto: Joyce Moser/Divulgação/Nosso TAL

Sinal de identificação

Você sabia que na comunidade surda cada pessoa é identificada por um sinal? Matheus e Gabriel explicam sobre o motivo e também o significado do sinal deles. Assista

Matheus e Gabriel Bressanini explicam sobre os sinais de cada pessoa na comunidade surda. Vídeo: Joyce Moser/Divulgação/Nosso TAL

Por Joyce Moser

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